03/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO32.7 - Produzindo cuidados em redes na ateção psicossocial |
47164 - ESTRESSE CRÔNICO EM MULHERES TRANS E TRAVESTIS EM SÃO PAULO: APLICAÇÃO DE NOVO MÉTODO DE QUANTIFICAÇÃO DE CORTISOL NO CABELO PAULA GALDINO CARDIN DE CARVALHO - FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA SANTA CASA DE SÃO PAULO; NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, A. RAIN MOCELLO - UNIVERSITY OF CALIFORNIA, SAN FRANCISCO, ANTONIO ALBERTO MOREIRA MOSCATELLI - FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA SANTA CASA DE SÃO PAULO; NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, SHERI A. LIPPMAN - UNIVERSITY OF CALIFORNIA, SAN FRANCISCO, MARIA AMELIA DE SOUSA MASCENA VERAS - FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA SANTA CASA DE SÃO PAULO; NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, JAE SEVELIUS - COLUMBIA UNIVERSITY IN THE CITY OF NEW YORK, SOPHIA ZAMUDIO-HAAS - DIVISION OF PREVENTION SCIENCE, UNIVERSITY OF CALIFORNIA, SAN FRANCISCO
Apresentação/Introdução No Brasil encontram-se bem documentadas inúmeras violações aos direitos humanos da população de pessoas trans e travestis. De acordo com a teoria de Estresse das Minorias, grupos socialmente marginalizados possuem maiores indices de depressão, ansiedade, uso de substâncias, ideação suicida e tentativas de suicídio. Atualmente, têm sido testado análise de cortisol em amostras de de cabelo como uma biometria para doenças crônicas e estresse, mas raramente com a população de pessoas trans. A medição do cortisol capilar é importante porque oferece uma avaliação de longo prazo e não invasiva dos níveis de estresse crônico. Ao analisar os níveis de cortisol no cabelo, que refletem o período de vários meses, ela fornece informações valiosas sobre os padrões de estresse de um indivíduo e seu possível impacto na saúde física e mental. Para explorar a factibilidade e aceitabilidade desses procedimentos, realizamos um ensaio clínico com mulheres trans e travestis em São Paulo.
Objetivos Descrever sociodemograficamente e explorar as principais questões relatadas como fonte de estresse de uma amostra de mulheres trans e travestis.
Metodologia Selecionamos aleatoriamente uma sub amostra de 180 participantes do Projeto Manas por Manas (R01MH121308), que são mulheres trans e travestis com 18 anos ou mais. Destas, 143 foram convidadas, até atingirmos uma amostra-alvo de 100 participantes. As entrevistas e coletas de fios de cabelo foram realizadas entre abril e dezembro de 2022. As participantes foram contactadas por telefone, WhatsApp ou redes sociais, em pelo menos três tentativas de contato. As visitas do estudo incluíram: (1) introdução sobre a pesquisa com um vídeo informativo; (2) assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; (3) breve pesquisa com a escala validada “Short Stress Overload Scale”, perguntas adicionais sobre cuidados com os cabelos que poderiam moderar os resultados do hormônio do estresse; e (4) coleta de aproximadamente 40 fios de cabelo. As amostras de cabelo foram armazenadas usando protocolos validados e enviadas para posterior análise. A média de duração das entrevistas foi de 60 minutos e as participantes foram reembolsadas pelas despesas de deslocamento. Para descrever a população, calculamos proporções para variáveis categóricas e mediana/intervalo interquartílico (IQR) para variáveis contínuas. Os resultados apresentados neste trabalho são complementados com anotações de comentários realizados durante as entrevistas.
Resultados e discussão As participantes entrevistadas tinham em média 34 anos (IQR: 26-40); 29% eram brancas, 32% negras e 39% parda/outra raça; possuíam renda média de R$1.150 (IQR: 500-2.000); e 81% tinham moradia estável. Dada a importância do cabelo na apresentação de gênero, as mulheres trans e travestis poderiam ter preocupações ou hesitações específicas sobre o fornecimento de uma amostra de cabelo, mas a coleta dos fios foi viável e aceitável e a maioria das razões apresentadas para recusar a participação no estudo refletiu barreiras gerais à participação em pesquisas, que não eram específicas para a coleta de amostras de cabelo, como por exemplo: falta de tempo de participar, ou morar em outra cidade. Comentários das participantes durante as entrevistas indicaram que várias tinham interesse em medir seu estresse. A a maioria identificou várias fontes para o mesmo: dificuldades em encontrar trabalho; problemas de relacionamentos, abusos sofridos pelos parceiros; dificuldades financeiras; discriminação vivenciada no trabalho ou ambiente de estudo; não aceitação de familiares de sua identidade de gênero, medo de ir até o local da entrevista e serem discriminadas; abordadas e confundidas com profissionais do sexo; medo de perder o trabalho e não ter como se sustentar; e preocupação com o futuro. A pandemia pelo Covid-19 também foi citada em algumas entrevistas, por exemplo, uma das participantes disse: "A pandemia veio pra destruir todos os sonhos das pessoas, eu quase não sobrevivi".
Conclusões/Considerações finais O estudo foi factível e aceitável. A partir dos comentários das participantes temos a evidência preliminar de altos níveis de estresse, transfobia, e de que os efeitos da desigualdade social podem causar impactos emocionais reais. Mediante a aceitação do método por parte das pessoas entrevistadas, ressaltamos a importância de considerar a medição do cortisol capilar para pessoas trans e travestis para avaliar os níveis crônicos de estresse, monitorar intervenções em saúde mental, identificar disparidades de saúde, avaliar a eficácia do tratamento e pesquisar o impacto de fatores sociais e interpessoais no estresse. Este método pode fornecer uma medida objetiva dos níveis de estresse a longo prazo e auxiliar na elaboração de intervenções e políticas para melhorar a qualidade de vida de pessoas trans.
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