Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO16.6 - Saúde Reprodutiva e ciclos de vida

47288 - CONTRACEPÇÃO REVERSÍVEL DE LONGA DURAÇÃO (LARC) NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: DESAFIOS ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS DE PLANEJAMENTO REPRODUTIVO NO BRASIL.
ELAINE REIS BRANDÃO - UFRJ, LETICIA MOUTINHO PALIS - IESC-UFRJ


Apresentação/Introdução
Este trabalho é fruto de pesquisa no Mestrado em Saúde Coletiva no PPGSC-UFRJ, e examina as experiências e desafios encontrados pelas mulheres para acesso ao dispositivo intrauterino (DIU) de cobre na rede pública de saúde brasileira, que constitui a única modalidade de LARC (long-acting reversible contraceptive) disponível de forma universal no SUS. Ainda que a oferta do DIU não-hormonal esteja regulamentada no sistema público de saúde desde 1984, são constatadas diversas barreiras – estruturais, organizacionais e moralizantes – de acesso a este métoo contraceptivo seguro, altamente eficaz e de longa ação (10 anos). Considera-se também a ascensão de políticas fragmentadas que estimulam a difusão seletiva de LARC hormonais (SIU com levonorgestrel ou implantes subdérmicos) – artefatos técnicos mais caros e respaldados pelo marketing farmacêutico -, em geral destinados a populações consideradas “em situação de vulnerabilidade”. Dessa forma, cabe problematizar a oferta dos LARC no SUS, considerando as dinâmicas de exclusão e seletividade que rodeiam as políticas públicas em planejamento reprodutivo.

Objetivos
De modo geral, objetiva-se analisar as condições sociais de oferta do DIU de cobre no SUS, em especial no município do Rio de Janeiro. Para tanto, pretendemos captar o olhar interpretativo das usuárias do SUS, bem como suas experiências com o uso do dispositivo na rede pública de saúde carioca, de modo a conhecer e compreender as dificuldades concretas narradas pelas usuárias para acesso a tal método anticonceptivo de longa ação.

Metodologia
Trata-se de pesquisa socioantropológica etnográfica, com recurso a duas estratégias de coleta de dados: pesquisa documental e entrevistas com mulheres adultas em idade reprodutiva (18 a 49 anos), usuárias do SUS, captadas em seus territórios ou via participação em grupos digitais do Facebook. Buscamos interlocutoras que apresentem experiência de demanda do DIU de cobre na rede pública de saúde do município do Rio de Janeiro, que podem ou não ter sido atendidas. Tal abordagem metodológica permite acessar a narrativa pessoal das entrevistadas – e suas visões sobre dispositivos e serviços de saúde -, e as ações/omissões do Estado que se revelam no cotidiano das instituições públicas de saúde. Este estudo integra a pesquisa mais ampla denominada “Governança Reprodutiva: desafios para o Sistema Único de Saúde no Brasil”, com apoio do CNPq, e cuja apreciação ética foi aprovada na Plataforma Brasil.

Resultados e discussão
A revisão da literatura nacional sobre o tema demonstrou a carência de estudos qualitativos atualizados sobre tal prática contraceptiva e como ela se (in)viabiliza no cotidiano dos serviços públicos de saúde. A realização de entrevistas com usuárias do SUS no Rio de Janeiro permitiu conhecer em detalhes os itinerários percorridos pelas mesmas em busca deste cuidado em saúde. Diversas estratégias são acionadas pelas mulheres na tentativa de se informarem a respeito, trocarem experiências com outras mulheres com a mesma demanda, conhecerem instituições alternativas (ONG) que disponibilizam o acesso ao DIU de cobre, identificarem unidades públicas de saúde próximas ao local onde residem onde poderiam obter o acesso ao DIU de cobre, apesar do tempo decorrido para tal ser bem mais longo do que desejariam.
Os principais desafios encontrados para o acesso universal ao DIU não- hormonal no SUS estão ligados a interposições burocráticas, grande rotatividade e/ou escassez de profissionais de saúde aptos à inserção do dispositivo nos serviços dea atenção primária à saúde, e veiculação da ideia de que o DIU de cobre pode se constituir em um método abortivo ou prejudicial ao organismo feminino. Os resultados obtidos na pesquisa documental revelam ainda entraves institucionais e muitos dissensos sobre quem pode ou deve ser o profissional de saúde apto à inserção do DIU de cobre. Permanece atual a disputa corporativa sobre ser tal prática exclusiva do especialista médico para inserção, negando-se a possibilidade de enfermeiras/os devidamente treinados realizarem tal procedimento, com segurança e ampla cobertura no território brasileiro, conforme diretrizes recentes do Ministério da Saúde. Também registramos a ausência de protocolos específicos nos municípios e a negligência na difusão do dispositivo como contraceptivo de emergência.

Conclusões/Considerações finais
A despeito dos avanços em saúde reprodutiva mostrados pela Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) em 2006, no que se refere à ampliação e diversificação das práticas contraceptivas em relação às décadas anteriores, são notáveis as dificuldades de pleno exercício do planejamento reprodutivo pelas mulheres brasileiras. Assim, é fundamental iluminar como a persistência de barreiras de acesso a insumos contraceptivos no SUS, particularmente ao DIU de cobre, tende a aprofundar iniquidades em saúde e restringir a autonomia reprodutiva das mulheres.