Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO15.5 - Violência de gênero e violência doméstica: lições para o sistema de saúde

46269 - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER E A FORMAÇÃO MÉDICA: PERCEPÇÕES E VIVÊNCIAS DE ESTUDANTES DE UMA ESCOLA MÉDICA PAULISTA.
ANA LUÍSA RIGOLIN - UNESP, CAROLINA SIQUEIRA MENDONÇA - UNESP, ELIANA GOLDFARB CYRINO - UNESP, NATHÁLIA STÉFANI WEBEL RAMOS - UNESP, BEATRIZ DE JESUS OLIVEIRA - UNESP


Apresentação/Introdução
A violência doméstica contra a mulher é um grave problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Suas implicações na vida cotidiana de mulheres são expressas em agravos à saúde, e em dores e sofrimentos imensuráveis. Em detrimento da alta prevalência, a violência contra a mulher é pouco investigada pelos profissionais de saúde no cotidiano das práticas, com destaque para o profissional médico. Acredita-se que a invisibilidade da violência nos serviços de saúde esteja relacionada, entre outros aspectos, à formação baseada no modelo biomédico.

Objetivos
Compreender a percepção dos estudantes e recém egressos de uma escola médica, pública, paulista acerca do aprendizado sobre a violência doméstica contra mulheres.


Metodologia
Trata-se de estudo exploratório de abordagem qualitativa, com enfoque na apreensão de percepções de graduandos e recém egressos acerca da abordagem da violência doméstica contra mulheres na formação médica. Para tanto, utilizou-se para coleta de dados, entrevistas semiestruturadas, com 8 estudantes de medicina cursando do 4º ao 6º ano e recém egressos de uma escola pública do interior de São Paulo. Trata-se de amostra intencional e por conveniência. A escolha dos participantes considerou as disciplinas e estágios que envolvem a saúde da mulher, o acesso aos participantes para realização das entrevistas, e a disponibilidade e consentimento em participar do estudo. As entrevistas foram gravadas, transcritas e analisadas conforme análise temática de conteúdo. A pesquisa foi aprovada no comitê de ética da instituição e é financiada pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC).

Resultados e discussão
O conteúdo das entrevistas originou uma categoria temática, a “rota crítica” da violência doméstica no currículo médico. Segundo os participantes, a violência doméstica contra a mulher é abordada de forma pontual e pouco aprofundada durante o curso médico, e associada à busca individual do estudante para maior conhecimento sobre o tema. No interior do currículo, a aprendizagem se mostrou relacionada à oportunidade de atendimento de um caso ou participação em projeto de extensão. Vale ressaltar que as discussões relacionadas foram apontadas pelos entrevistados como majoritariamente balizadas no modelo biomédico, em contrapartida a uma abordagem que considere os aspectos sócio-históricos constituintes do problema. Nesse contexto, os entrevistados indicaram como caminho alternativo, a busca individual do estudante por meio de atividades extracurriculares, como luta no movimento estudantil e participação em ligas acadêmicas. Compreender as causas referentes ao envolvimento dos estudantes nessas atividades vem suscitando interesse em investigações produzidas no interior dos cursos médicos. Várias razões são citadas para explicar a situação: necessidade, sentida pelo estudante, de aquisição de conhecimentos e novas experiências que complementam o currículo; a necessidade de urgência em vivenciar o ser médico por meio de aprendizados significativos; a definição profissional e, em alguns casos, motivos de ordem econômica. Nos caminhos formativos percorridos pelos estudantes, chama a atenção a potência de um educador mediador e um ensino que integre teoria e prática, que são vistos pelos entrevistados como um exemplo para a prática médica humanizada. Na construção contínua da formação de profissionais da saúde, uma melhor compreensão das participações extracurriculares poderia suscitar reflexões sobre as insuficiências curriculares, e melhorias no currículo formal. Neste contexto, evidenciamos a curricularização da extensão, como potência para maior integração teórico-prática e interação entre universidade, serviços de saúde e comunidade, e também as novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) de 2014, que se pauta em uma formação em saúde humana e integral, bem como as metodologias ativas de ensino e aprendizagem dialética como diretrizes do processo.


Conclusões/Considerações finais
Considera-se que o ensino médico referenciado pelo modelo biomédico apontado pelos entrevistados contribui para a invisibilidade do problema e para a vulnerabilidade de mulheres à violência doméstica. Além disso, para o atendimento humanizado e integrado como preconizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Os resultados obtidos apontam na direção das fundamentações técnicas para a implantação das novas DCN, com foco em aprendizagens que integrem teoria e prática, considerem os diferentes aspectos que envolvem a vida cotidiana de mulheres e que impactam no processo saúde-doença, e que desenvolvam competências para um cuidado acolhedor, humanizado e integral às mulheres. Apesar da presente pesquisa trazer resultados relevantes, há a necessidade de novos estudos para ampliar a inserção do tema da violência doméstica no currículo médico. Nessa direção, Batista afirma que "pensar o ensino médico no contexto atual exige a ousadia de não enquadrar as demandas em velhos modelos de aprendizagem, mas a lucidez de encontrar, nas situações concretas, suas potencialidades de formação".