Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC32.6 - Boas práticas em saúde mental

46713 - O CONCEITO DE RECOVERY EM DEBATE: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE UM COLETIVO DE PESQUISA COMPOSTO POR USUÁRIOS/AS DE SERVIÇOS DE SAÚDE MENTAL
ANGELA PEREIRA FIGUEIREDO - UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, MARTINHO BRAGA BATISTA E SILVA - UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO


Apresentação/Introdução
O presente trabalho é resultado de uma pesquisa de doutorado, defendida no final do ano de 2021 no Instituto de Medicina Social da UERJ, que visou envolver usuários/as de serviços de saúde mental durante todo o seu processo. A partir da prática exercida com o programa de grupos de ajuda e suporte mútuos em saúde mental no Rio de Janeiro-RJ, e da convivência a longo prazo com seus usuários/as, foi instaurado um coletivo de co-pesquisadores para que houvesse planejamento conjunto da pesquisa, incluindo seus objetivos e estratégias. A partir dessa iniciativa, um objetivo foi estipulado para compreender os processos de recovery de outros/as usuários/as da rede de saúde mental do referido município, por meio de entrevistas em dispositivos nos quais os/as co-pesquisadores se inseriam. Com a realização do doutorado sanduíche na Service User Research Enterprise da King’s College London, buscou-se compreender como usuários/as de serviços de saúde mental são inseridos/as nas pesquisas daquele contexto, dada a relevância da tradição britânica para esta área de conhecimento. Devido à pandemia da COVID-19, as entrevistas deram lugar à realização de testemunho pessoal da autora principal sobre a experiência de pesquisa com o coletivo de co-pesquisadores; revisões da literatura mundial e brasileira sobre pesquisas com o envolvimento de usuários/as de serviços de saúde mental; além de debate sobre o conceito de recovery de acordo com críticas apreendidas na realidade britânica de saúde mental e com a concepção produzida pelo coletivo de co-pesquisadores, este último consistindo-se foco deste trabalho.

Objetivos
O trabalho tem como objetivo principal o debate acerca do conceito de recovery, contextualizando-o a partir de críticas a ele elaboradas, com as quais se teve contato principalmente a partir do contexto britânico de saúde mental, para então apresentar a apropriação de recovery elaborada pelo coletivo de co-pesquisadores, localizada em nosso contexto próprio de saúde mental e atenção psicossocial.

Metodologia
Fundamentado no conceito de recovery, relacionado ao protagonismo desses usuários/as, tornados co-pesquisadores, o trabalho apresenta uma orientação metodológica guiada pelo pressuposto conceitual. O protagonismo do/a usuário/a, como um dos pontos centrais do conceito de recovery, assumiu lugar de destaque no modo pelo qual foi realizada a pesquisa. Assim, podemos dialogar com o conceito de recovery a partir de sua relevância também para a construção da metodologia. Para além de considerar a postura ativa dos sujeitos que compõem o estudo, a pesquisa a tomou como norteadora, uma vez que teve como imprescindível para a sua construção o princípio da participação. A pesquisa, desse modo, partiu do que os/as usuários/as co-pesquisadores consideravam importante: diante de seus processos de recovery, de suas diversas inserções nas redes de saúde e de saúde mental e, sobretudo, de suas inserções na sociedade como um todo.

Resultados e discussão
Há uma grande discussão na apropriação da abordagem de recovery segundo aqueles que o utilizam- usuários/as, profissionais, trabalhadores/as, gestores/as, articuladores/as de políticas públicas ou pesquisadores/as - e também ao que condiz ao contexto em que é incorporado. Por meio da experiência de doutorado sanduíche, pôde-se entrar em contato com outra realidade em que eram presentes críticas contundentes ao conceito, tanto por parte de pesquisadores, quanto por parte do movimento de usuários/as de serviços. Tais críticas são divididas de acordo com: a epistemologia do termo; suas implicações políticas e prático-assistenciais; e as alternativas levantadas. Para abordar o conceito no Brasil, é necessário articulá-lo às nossas particularidades, seja nas formas de assistência em saúde mental, ou na sua interlocução com a produção de conhecimento, e nas relações sociais, de maneira mais ampla. Para tanto, recovery foi discutido coletivamente com os/as co-pesquisadores e o material da discussão agrupado de acordo com a definição feita pelo coletivo; o conceito de acordo com as relações sociais e estruturais do coletivo; a relação com o modelo assistencial e com profissionais de saúde mental.

Conclusões/Considerações finais
Como podemos falar de recovery no nosso atual contexto social? A que tipo de sociedade estamos nos referindo? E, tratando-se do modelo de sociedade, que modos de pertencimento nos são possibilitados? Por meio da oportunidade de poder ter entrado em contato com visões diversas e de ter dialogado com outras considerações ao conceito, foi importante atribuir um maior cuidado com formas de apropriação, visto que temos histórico particular de reforma psiquiátrica, e um modelo completamente diferente de organização de ativismo na área da saúde mental. Desse modo, considera-se que a realização de qualquer análise de recovery, na nossa sociedade, deve perpassar toda uma estrutura social de modos de subjetivação particulares, e de um modelo de atenção psicossocial distinto.