Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC32.6 - Boas práticas em saúde mental

46045 - NARRATIVAS EM SAÚDE MENTAL: RÁDIO “DELÍRIO CULTURAL” E OUTROS PROTAGONISMOS
CAMILA FORTES MONTE FRANKLIN - FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
Os modos de tratar sobre a loucura variam de acordo com as temporalidades e espacialidades existentes. Seja a nível de diagnóstico ou de narrativas, o tratar (sobre) a loucura foi configurado e reconfigurado ao longo do tempo, de modo que para cada época, havia a sua maneira de lidar com os sujeitos considerados impróprios para o convívio (FRANKLIN, 2020). A depender dos envolvidos e das relações de poder que ali se faziam presentes, a Igreja Católica, a Psiquiatria, o poder jurídico e outras instituições de controle de corpos e subjetividades, detinham o poder de afirmar quem era louco e quem era são (FRANKLIN, 2022). Essa configuração do Outro que fala sobre as pessoas então denominadas loucas, ecoa até os dias atuais sobre as pessoas com transtornos mentais, quer seja através do processo diagnóstico, das narrativas midiáticas ou do âmbito sociocultural que ainda oprime, silencia e estigmatiza os sujeitos e sujeitas com transtornos psiquiátricos. É pensando no protagonismo, na autonomia e na visibilidade dessas pessoas e narrativas, que o Instituto Juliano Moreira e o Museu Bispo do Rosário de Arte Contemporânea dão origem à Rádio Delírio Cultural, cujo objetivo é possibilitar um canal de troca de experiências entre pacientes, artistas, voluntários e comunidade. Dito isso, o presente trabalho tem como objetivo perceber e apontar de que modos a produção de narrativas desenvolvida pela Rádio DC dá origem a novos modos de operação e de construção de sentidos sobre a loucura, assim como a um movimento de ruptura de narrativas estigmatizantes, dando origem a novos modos de narrar e de se narrar. O exercício desta pesquisa é observar como as narrativas ou auto-narrativas de pessoas com transtornos mentais promovem formas de ser e estar no mundo.

Objetivos
Compreender de que modos a produção de narrativas desenvolvida pela Rádio DC dá origem a novos modos de operação e de construção de sentidos sobre a loucura;
Apontar de que modos a comunicação midiática da Rádio DC, imersa nas práticas socioculturais, interferem nos modos de ser e estar no mundo;
Identificar a partir das narrativas da Rádio DC, como os sujeitos narradores se apropriam do espaço midiático.


Metodologia
Enquanto aporte teórico-metodológico, utilizo a Narratologia (MOTTA, 2005; BORGES, 2014) como instrumento analítico de pesquisa, esta, se apresentando como uma ferramenta capaz de apontar a formação de processos simbólicos que conferem significados à realidade. Assim, no presente trabalho, essa metodologia se torna um guia, um dispositivo argumentativo (MOTTA, 2017) capaz de apresentar diversas camadas de interpretação sistemática, ao capturar memórias que são compartilhadas socialmente, cujas homologias são realocadas para um tempo presente e que interferem nos modos do que os sujeitos e sujeitas produzem significação no processo de recepção da narrativa.

Resultados e discussão
Percebe-se que a Rádio DC se apresenta para além de um veículo midiático e comunicacional. Nessa pesquisa, a Rádio se torna um marco analítico que aciona narrativas, elementos, significados e sintomas, explorando a capacidade e legitimidade de enunciar o sentido das experiências (MARQUES, 2013), que ganham contexto a partir dos modos que as narrativas são configuradas e relatadas pelos sujeitos. Esse processo de configuração e recepção da narrativa (RICOEUR, 1983), permite identificar que os sujeitos narradores da Rádio se apropriam do espaço midiático de modo a alterar os sentidos construídos historicamente em relação às pessoas com transtornos mentais, sobretudo no que se refere a um lugar e direito à voz nos ambientes sociais e comunicacionais.

Conclusões/Considerações finais
Questionamos, então: Qual a relação desses relatos de experiências a partir de tempos históricos distintos? É através da formação de processos simbólicos que conferem significados e sentidos à realidade (MOTTA, 2005; BORGES, 2014), que as narrativas conduzem e são conduzidas a partir das experiências, das informações, notícias, ideias, produtos, serviços e entretenimento, e dos relatos construídos pelos sujeitos narradores da Rádio DC. Esse processo sofre influências diversas, entre elas, os relatos individuais, o acesso à informação e a disseminação desta, a limitação do script dos programas, e a apropriação publicitária – que embora não haja um viés mercadológico, as estruturas narrativas acionam visibilidade para determinados atores, agentes, produtos e instituições.
Considera-se que as narrativas desenvolvidas pela Rádio DC são capazes de produzir determinados efeitos de sentido que privilegiem as performances dos sujeitos que enunciam essas narrativas, de modo a fomentar a visibilidade e a autonomia que lhes foram comprometidas durante um processo histórico estigmatizante, em que o Outro constantemente regulamenta a existência e a voz das pessoas com transtornos mentais, seja no processo diagnóstico de patologização ou de despatologização (WILSON; FRANKLIN, 2022) ou de relação sociocultural.