03/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC32.4 - Saúde mental, ciências sociais e psicanálise |
46958 - A GRUPOTERAPIA BREVE PSICANALÍTICA COMO FERRAMENTA DE CUIDADO PARA MULHERES EXPOSTAS À VIOLÊNCIA KELLY KARINA OLIVEIRA DE ALMEIDA - UNICAMP, ROSANA TERESA ONOCKO CAMPOS - UNICAMP
Apresentação/Introdução Este trabalho desenvolve-se no âmbito do cuidado às mulheres expostas à violência e insere-se numa pesquisa de implementação de um ambulatório para vítimas de violência, construído de forma participativa com os trabalhadores dos serviços da rede de saúde e da assistência social, na região norte de Campinas, referenciada pelo Hospital Universitário da UNICAMP, local onde o ambulatório foi implementado. A necessidade de implementação deste ambulatório fundou-se nos altos índices de violência vividos pelas mulheres, crianças e adolescentes da cidade de Campinas-SP, segundo dados registrados no SISNOV - sistema de notificação de violência e no reconhecimento dos riscos ligados à perpetuação dessa violência de forma transgeracional (Benghozi, 2000). Como alternativa para a superação desses entraves, na literatura internacional, citam-se a implementação de dispositivos de oferta de cuidado qualificado em saúde mental, com a formação continuada dos profissionais.
Objetivos Este trabalho proporcionará além do cuidado das mulheres expostas à violência, construir evidência sobre a efetividade da psicoterapia psicanalítica grupal no tratamento de mulheres expostas à violência. Além disso, temas como racismo, machismo, classe, lgbtfobia, e outros, são poucos abordados ainda na saúde mental, deixando rastros do traumático em que narrativas coletivas e testemunhadas têm um papel fundamental na sua elaboração.
Metodologia Conforme a proposta da metodologia da pesquisa de implementação, que conversa com a ideia Bioniana (1962) de aprender com a experiência, temos aprendido muito até aqui. Exemplo recente foi o desenvolvimento do espaço “Ambiência” que foi sendo aprimorado, evoluindo da proposta de uma recreação para os filhos/irmãos das participantes dos grupos terapêuticos enquanto aguardavam na sala de espera, para a proposta de um brincar não dirigido com monitores treinados a realizar uma escuta atenta às manifestações da exposição à violência. A ambiência mostrou-se um elo entre os grupos terapêuticos, como as malhas institucionais (Benghozi, 2010), além de ser mais uma oferta que proporciona a permanência das mulheres no grupo, principalmente as que não dispõem de redes. Realizamos quatro ciclos de grupoterapia para mulheres acima de dezoito anos, entre janeiro de 2021 e dezembro de 2022. Cada ciclo contou com oito sessões de noventa minutos de duração, sempre no mesmo dia e no mesmo horário e duas terapeutas/coordenadoras, após cada sessão realizamos supervisão clínica. No total, 35 mulheres foram atendidas pelo Ambulatório nesse período.
Resultados e discussão Nos grupos de mulheres realizados, uma das marcas para as participantes foram os momentos de solidariedade e em alguns casos, ampliaram as redes, tais experiências quando vivenciada na perspectiva da ética do cuidado de si, como diria Foucault, a amizade é capaz de suscitar grandes mudanças nas relações de poder, tornando as pessoas mais livres, menos governadas. Pensar a partir da amizade é lançar o desafio para que novos modos de relacionamentos possam surgir e assim também novas formas de subjetividade e de sociabilidade” (PELLIZARO, 2015, p. 113). O encontro grupal que provoca ou não a amizade, apresenta-se como uma potência subversiva, na medida em que possibilita deslocar o sujeito das suas identidades atuais construídas a partir do outro e de si mesmo, ao lhe lançar na construção de espaços intermediários entre o individual e o coletivo (ORTEGA, 1999). O uso da psicanálise justifica-se no contexto da abordagem e da prevenção à violência na medida em que espaços seguros de escuta podem oferecer à pessoa exposta à violência um lugar, legitimar sua experiência e possibilitar a elaboração da vivência traumática que, quando narrada e compartilhada, pode ser ressignificada; do contrário, corre-se o risco de invalidar, negar, calar e, por isso, perpetuar a violência que vai sendo vivida, transmitida e naturalizada. A psicanálise torna-se um marco teórico adequado para pensar a violência, suas causas e suas consequências individuais e coletivas, bem como para propor intervençòes e prevenção da transmissão transgeracional (KAES, 1998; CORRÊA, 2000) e dispositivos terapêuticos que operacionalizam as interações entre os níveis coletivos, intersubjetivo e intrapsíquico.
Conclusões/Considerações finais Esta pesquisa possibilitará entender como as intervenções previstas funcionam nas configurações do "mundo real", testando abordagens para melhorá-las. Ressaltamos que o aumento da violência durante a pandemia, contribuiu ainda mais para a emergência do cuidado de pessoas expostas à violência, e da necessidade de trabalhos em grupos presenciais, retirando do isolamento e do silenciamento as experiências violentas vividas. Uma das contribuições dos grupos é justamente estimular o compartilhamento e as trocas, além da possibilidade de construir e fortalecer vínculos saudáveis, de maneiras até então não vividas e experienciadas.
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