Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC15.5 - Direito humano fundamental à saúde: identidade e símbolos na diversidade

47961 - DOAÇÃO DE SANGUE POR LGBTQIAPN+: NOTAS PRELIMINARES DE PESQUISA EM UM BANCO DE SANGUE
LUCIANA MIRANDA RODRIGUES - IFF/FIOCRUZ E INTO/MS, IVIA MARIA JARDIM MAKSUD - IFF/FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
O sangue, do ponto de vista simbólico, apresenta uma historicidade como a ‘fonte da vida’. A necessidade de sangue e seus componentes para transfusões de pacientes em tratamentos de quadros de doenças crônicos e de risco iminente são indispensáveis para a garantia da vida. Apesar dos avanços da indústria farmacêutica e da disponibilidade da tecnologia de nano fármacos e biomateriais substitutivos temporários, ainda hoje o sangue não conseguiu ser totalmente substituído pela indústria. Tal fato faz dele, ainda, um insumo de alta relevância para a saúde coletiva da população mundial. Por longos anos, desde o advento do HIV e da Aids, os homens homossexuais e bissexuais, bem como as travestis e as transexuais, não podiam doar sangue, pois eram inclusos em um “grupo de risco” para alta probabilidade de HIV/Aids. Tais pessoas estavam envoltas em situações preconceituosas e estigma social, tendo sua imagem associada às ideias de “risco” e “promiscuidade”. A luta pelo direito à doação de sangue por parte da comunidade LGBTQIAPN+ iniciou-se em 2016, com uma ação de inconstitucionalidade no Superior Tribunal Federal cuja deliberação foi favorável a toda comunidade em 2020.

Objetivos
Esta comunicação objetiva discutir a doação de sangue de pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ pelas lentes de voluntários a doadores e profissionais de saúde.

Metodologia
O método da pesquisa foi etnográfico e desenvolvido em um hospital da rede pública federal no Estado do Rio de Janeiro, num banco de sangue. Contou com 23 entrevistas com voluntários doadores de sangue e 18 entrevistas com profissionais de saúde. Dentre as entrevistas realizadas com voluntários, 6 autorreferiram-se como LGBT. Também foram realizadas anotações detalhadas sobre o cotidiano do serviço de banco de sangue em diário de campo, notas estas provenientes de observação participante realizada na unidade, desde a recepção dos voluntários à saída ao final do atendimento.

Resultados e discussão
A observação das relações intersubjetivas entre voluntários e profissionais de saúde permitiu identificar situações e processos de vulnerabilidades, limites e possibilidades de escolhas no que tange à triagem clínica de doadores de sangue. Os motivos para a doação de sangue pelos voluntários variaram, destacando-se a vontade de ajudar o próximo, por um lado, e a testagem para conhecimento do status sorológico, em resposta ao receio de doenças ocasionadas por IST, sobretudo o HIV, por outro lado. Nas narrativas dos profissionais de saúde triagistas, o tema do estigma também se fez presente como um desafio a ser enfrentado. Mas os discursos também revelaram comportamentos de avaliação subjetiva e pessoal direcionados a julgamentos de imagem dos corpos homossexuais Dessa maneira, alguns profissionais podem sinalizar preconceitos velados que conduzem a decisões subjetivas, ou ao que é conhecido como “descarte subjetivo”. A justificativa nesse caso seria a “falta” da verdade do paciente e a insegurança transfusional. Essas condutas mostram uma aproximação teórica com a violência simbólica proposta por Bourdieu (1989; 2004). Por esta leitura, agentes do campo da hemoterapia (médicos, enfermeiros, laboratoristas, entre outros) fomentam tais discussões pautadas em evidência científica discutível pois mantém esse grupo de pessoas na alta linha de vulnerabilidade para a transmissão do HIV.

Conclusões/Considerações finais
A despeito da luta dos movimentos sociais contra a homofobia e a favor da doação de sangue, as questões de cunho moral ainda se fazem muito presentes na sociedade, mantendo os obstáculos que afastam a comunidade LGBTQIAPN+ dos bancos de sangue.