03/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC11.2 - Idadismo, gênero e violação de direitos |
48052 - LEGISLAÇÃO DO IDOSO: INCLUSÃO OU EXCLUSÃO? REFLEXÕES SOBRE POLÍTICAS DE MORADIA JULIANA DE FÁTIMA FIGUEIREDO MENDONÇA DE ASSIS - UFPE, KÁTIA MEDEIROS DE ARAÚJO - UFPE
Apresentação/Introdução Esta reflexão integra dissertação de mestrado em andamento, originada na experiência profissional da primeira autora junto ao programa Cidade Madura/PB. A gestão da velhice, antes considerada própria da esfera privada e familiar, socializou-se tornando-se uma questão pública, permitindo ao Estado e às organizações privadas, na tentativa de homogeneizar as representações da velhice, definirem um conjunto de orientações muitas vezes contraditórias. Produz-se, assim, uma nova categoria social: “os idosos, como um conjunto autônomo e coerente que impõe outro recorte à geografia social, autorizando a colocação em prática de modos específicos de gestão” (DEBERT, 2020, p.13-14). Camarano (2016) mostra como o processo se desenhou no cenário internacional e no Brasil: na década de 1970, o processo de envelhecimento já se encontrava em estágio avançado nos países de centro; assim, emergiram políticas públicas diversas voltadas às populações idosas que objetivavam reconduzir o idoso ao seu papel social e prevenir a perda da sua autonomia. No ano de 1982, em Viena, realizou-se a Assembleia das Nações Unidas sobre Envelhecimento, o primeiro fórum de âmbito mundial intergovernamental centrado na temática, que resultou em um plano global de ação baseado nas condições de vida dos idosos dos países desenvolvidos. Expressões como independência, autonomia, envelhecimento saudável e ativo destacam pontos relevantes - palavras-chaves que reverberam em leis, estatutos e ações políticas das sociedades contemporâneas (CAMARANO, 2016). A participação do Brasil no plano de ação de Viena influenciou a criação de políticas públicas sobre envelhecimento do país, a exemplo da Política Nacional do Idoso (PNI), Lei nº 8.842/1994 e o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), que regula e efetivação dos direitos assegurados a esta fatia da população. Costa et al. (2016) destacam a destinação de cotas para pessoas idosas em programas habitacionais; e a concepção de conjuntos habitacionais exclusivos para idosos - a exemplo do condomínio Cidade Madura, parte das políticas públicas que se tornou lei no Estado da Paraíba em 2018.
Objetivos Problematizar o conceito de autonomia que permeia as ideias sobre envelhecimento no contexto da legislação do Programa Habitacional Cidade Madura.
Metodologia Na discussão, articulamos leituras do campo sociocultural, a legislação que embasa o Programa Habitacional Cidade Madura e entrevistas com gestores.
Resultados e discussão A legislação do Programa Cidade Madura (Lei nº11.260/2018) categoriza a pessoa idosa a partir do fator etário e admite apenas o idoso ativo, autônomo e independente como beneficiário. A perda de autonomia física ou mental do residente leva à rescisão da autorização de moradia, cabendo à família a responsabilidade pelo idoso e, em não havendo família, a outras instituições do Estado. Entre outras questões, consta no regimento a proibição aos moradores de residirem com animais domésticos, se estendendo a novos moradores. Juntamente à determinação de que apenas pessoas idosas podem residir no condomínio, o regimento sugere indagações, já que experiências relatadas na literatura destacam como relevante à saúde os vínculos afetivos dos idosos com familiares e com seus animais domésticos. Segundo a assistência social do programa, ocorreram casos em que contemplados renunciaram à moradia para não se separarem de seus pets.
Conclusões/Considerações finais Destacamos que a Assembleia de Viena teve grande importância na viabilização da problemática do envelhecimento, pelo pioneirismo em âmbito mundial. Atentando para as disposições do programa Cidade Madura, identificamos claramente que a construção de suas ações à população idosa seguiu o plano de ação de Viena, corroborando a percepção de Debert (2020) sobre as tentativas de homogeneização da velhice. No caso do programa Cidade Madura, percebemos que do ponto de vista da sua legislação, reverbera o discurso uniformizador da velhice protagonizado por um conceito positivo e ativo de envelhecimento, além da ideia do envelhecimento como experiência separada da família, em descompasso com e vivência relacional da maioria da população brasileira, sobretudo nas camadas populares. Em última análise, destacamos que certas determinações da proposta, que se apresentam como garantia de direitos e proteção social à pessoa idosa, entretanto, podem se tornar excludentes, frente às situações de vulnerabilidade, perda de autonomia e de independência que são, se não naturais, recorrentes ao processo de envelhecimento no contexto brasileiro. Por exemplo, as pessoas idosas beneficiárias do programa que venham a vivenciar comprometimento de autonomia acabam perdendo não apenas o direito à moradia, como também os vínculos sociais e com ambiente construído. Para finalizar, concluímos ser benéfico às políticas públicas de moradia dos idosos atentarem para dimensão cultural local e familiar da experiência dos beneficiários, apesar da importância de um escopo internacional legitimador.
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