Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO30.2 - Diálogos entre saúde, cuidado e cultura

47079 - A VIDA PARA ALÉM DE UM DIAGNÓSTICO CLÍNICO: PROTAGONISMO COMUNITÁRIO, ARTE E PROMOÇÃO DA SAÚDE EM TERRITÓRIOS ENDÊMICOS PARA LEISHMANIOSE CUTANEA
SILVIA TAVARES DE AMORIM - UFBA, LENY ALVES BONFIM TRAD - UFBA


Contextualização
Historicamente, as formações em Saúde, majoritariamente, se fundamentam em modelos que tomam o biológico como bússola. O foco na doença, muitas vezes, impossibilita pensar o que existe antes e depois de um diagnóstico clínico: a vida. Assim como as subjetividades, as culturas, as práticas comunitárias, inclusive de cuidado, de prevenção de doenças, recuperação e promoção da saúde. Neste trabalho apresentamos algumas questões relacionadas com a Leishmaniose cutânea (LC), uma doença infecciosa transmitida a seres humanos e animais e que afeta a pele e mucosas das/dos infectadas/os. Trata-se de um relato de experiência enquanto pesquisadora/doutoranda em saúde coletiva atuando no projeto transdisciplinar ECLIPSE, uma parceria entre a UFBA (Brasil), Keele University e KMMS (Inglaterra), Rajarata University (Sri Lanka) e Mekelle University (Etiópia). O projeto se fundamenta nas perspectivas transdisciplinares e da promoção emancipatória da saúde, atuando em algumas comunidades situadas no sul da Bahia, área endêmica para LC.


Descrição
A LC é uma doença que pode gerar estigma. As lesões e os demais sintomas da doença, dentro de um modelo biomédico de assistência à saúde, se tornam foco. Os riscos disso estão na não priorização e/ou invisibilidade dos demais processos produtores de saúde e vida, individual e coletiva. Novas formas de fazer pesquisa e produzir cuidado em saúde sobre/com/para/nas comunidades são caminhos para relações menos hierarquizadas e mais equânimes. Neste sentido, o projeto é composto por uma equipe transdisciplinar com pessoas das ciências da saúde, sociais e humanas, artes, comunicação etc, professoras/es, estudantes da graduação, pós-graduação e moradores/articuladores das comunidades. A experiência em curso utilizando a artenografia (uma prática que associa as artes e a etnografia) nos territórios tem permitido reconstruir algumas representações sobre estas comunidades a partir do protagonismo das pessoas que as constituem, de seus corpos-territórios, suas narrativas, seus desejos. Propõe-se também refletir e analisar a interação pesquisadores-comunidades, assinalando a potência da relação afetiva e de amizade que estão sendo constituídas.

Período de Realização
O projeto ECLIPSE, ainda em curso, desenvolve estas atividades/pesquisas com as comunidades do Sul da Bahia há 3 anos.

Objetivos
Movidas pelo pressuposto de que as práticas de cuidado em saúde podem ser diversas e coletivas, objetiva-se relatar/compartilhar a experiência de pesquisa/prática comunitária em territórios rurais localizados no sul da Bahia. Apresentando possíveis caminhos para a equidade em saúde, em contraponto às práticas biomédicas, através das vivências embasadas na artenografia, prática emancipatória e não hierarquizada da saúde.

Resultados
Pretende-se neste trabalho apresentar algumas das co-produções que vêm sendo geradas neste processo e que tem potencializado a produção de conhecimento, a formação em pesquisa engajada e os impactos esperados. Serão destacados um livro (“Histórias de uma pedra cortada”) e dois filmes (“Orobó e o cinema elas e O Tempo das coisas”) baseados na lógica do cinema comunitário, os quais nasceram do desejo da comunidade de recontar suas histórias sob outra ótica que não a do estigma resultante dos casos de Leishmaniose na comunidade.

Aprendizados
De nosso lugar, enquanto sanitaristas, pensando a saúde coletiva como uma prática/ciência que tem como pressuposto os processos sociais e históricos, as atrizes/atores que constroem a saúde, consideramos que a associação entre a arte e educação popular em saúde, se estabelece como caminhos possíveis para construir o bem-viver e a equidade em saúde. No caso das comunidades rurais em questão, a Leishmaniose é um fragmento da história das pessoas/comunidades que residem. A vida, suas trajetórias de vida, saberes e práticas de cuidado perpassam um código de classificação de doenças. Nosso foco não é a doença, mas sim promoção de saúde e vida.


Análise Crítica
É importante lembrar que classificações como margem e centro, populações vulnerabilizadas ou não etc, são heranças do processo colonizador. Estas comunidades, enquanto comunidades rurais, comunidades negras (algumas em processo de reconhecimento enquanto quilombos) possuem histórias, manifestações culturais e as mais diversas resistências (no protagonismo do campo, das mulheres, dos saberes populares e ancestrais etc). Urge avançar na promoção da equidade social no Brasil e também na descolonização da pesquisa, da formação e do cuidado à saúde. É preciso reconhecer outros horizontais no campo da saúde, para além do biomédico, pautados na escuta, no reconhecimento e na emancipação de sujeitos e territórios.