02/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO26.2 - Maternidades negras insurgentes, complexas e desafiadoras |
46210 - REVELANDO AS MARGENS: A REALIDADE COTIDIANA DAS MULHERES EM SITUAÇÃO DE RUA NA PERSPECTIVA DA INTERSECCIONALIDADE E DECOLONIZAÇÃO OCTÁVIA CRISTINA BARROS - IPUB-UFRJ, OCTAVIO DOMONT DE SERPA JR - IPUB-UFRJ
Apresentação/Introdução Esta pesquisa analisa a realidade das mulheres em situação de rua em um município do interior do Rio de Janeiro, destacando a vulnerabilidade e marginalização, bem como as interseções de gênero, raça, classe e identidade. O município tem uma história marcada pela cultura manicomial, refletindo uma abordagem com raízes na colonialidade, onde a psiquiatria foi usada como forma de controle e repressão. A desinstitucionalização é vista como uma luta pela decolonização. A pesquisa destaca a importância do fortalecimento da rede de atenção psicossocial (RAPS) para abordar as necessidades de saúde física e mental, violência e vulnerabilidade social dessas mulheres.
Objetivos Esta pesquisa visa examinar as causas sociais, as experiências individuais do sofrimento e as estratégias de sobrevivência das mulheres em situação de rua assistidas pelo Consultório Na Rua, sob as lentes da interseccionalidade e da decolonização.
Metodologia Entre setembro e dezembro de 2022, um estudo foi realizado com seis mulheres em situação de rua, com idades entre 35 e 43 anos. O objetivo da pesquisa foi explorar e descrever as características dessa população, buscando construir novas perspectivas sobre o assunto. O estudo recebeu aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE 58057422.6.0000.5263), e todas as entrevistas foram conduzidas após as participantes assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A abordagem adotada foi inspirada no trabalho de Veena Das (2008), que enfatiza a importância de compreender o sofrimento social considerando fatores sociais, políticos e econômicos. Para analisar os dados coletados, utilizou-se a metodologia da Condensação Sistemática de Textos, proposta por MALTERUD (2012), que permitiu a organização dos dados em categorias e a identificação de temas emergentes, proporcionando uma compreensão mais aprofundada das narrativas e dos significados atribuídos pelas mulheres em situação de rua.
Resultados e discussão Os resultados da pesquisa revelaram as complexidades enfrentadas pelas mulheres em situação de rua:
“Fui estuprada pelo padrasto, a minha mãe não ficou do meu lado, resolvi sair de casa (...)”
Para algumas, a situação de rua pode ser uma solução inicial para escapar de situações de violência e traumas vivenciados em seus lares, o que muitas vezes as impede de desejar retornar a esse ambiente. A interseção com a raça agravou ainda mais as experiências, tornando as mulheres negras em situação de rua particularmente vulneráveis a formas específicas de discriminação e violência:
Daniele, 35 anos, negra, foi encontrada muito alterada, chorando desesperadamente depois de ter sido separada compulsoriamente do seu bebê de cinco meses: “Agora não tenho mais motivos para viver, vou me entregar ao crack(...)”
A separação compulsória mãe e bebê revela a violência estrutural que está enraizada no sistema colonial e escravagista, que moldou as relações sociais, econômicas e culturais no Brasil. A discriminação racial é um fator crucial nesse contexto, uma vez que a população negra é frequentemente marginalizada e excluída dessas esferas da sociedade (RICHWIN & ZANELLO 2023).
Nessa perspectiva, a violência institucional desempenha um papel significativo na vida dessas mulheres, restringindo sua capacidade de expressar autonomia e moldando as dinâmicas de poder (DAS,2008):
“Em uma das primeiras noites na rua, um homem se aproximou, me tocou e disse que eu era pública como a rua (...)”
Diante desse cenário, as formas de violência observadas evidenciam o papel das normas patriarcais presentes na sociedade, que promovem a objetificação e a desvalorização das mulheres, resultando na perpetuação da violência e da marginalização.
Conclusões/Considerações finais Esta pesquisa destaca as manifestações de opressão decorrentes das normas patriarcais na sociedade, fornecendo uma reflexão crítica sobre as estruturas de poder e a necessidade de transformação social. Ela ressalta como a desigualdade de gênero permeia as esferas estatal e social, demandando uma abordagem ampla e interseccional para enfrentá-la.
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