Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO33.5 - Comunidades tradicionais e contaminação ambiental e Covid 19

46560 - USO DE AGROTÓXICOS NAS PLANTAÇÕES DE CANA-DE-AÇÚCAR EM PERNAMBUCO E DANOS À SAÚDE DO TRABALHADOR
RENATA CORDEIRO DOMINGUES - IAM-FIOCRUZ/PE, ALINE DO MONTE GURGEL - IAM-FIOCRUZ/PE, ROMÁRIO CORREIA DOS SANTOS - UFBA, FERNANDA LOWENSTEIN MONTEIRO DE ARAÚJO LIMA - IAM-FIOCRUZ/PE, CARLA CAROLINE SILVA DOS SANTOS - IAM-FIOCRUZ/PE, IDÊ GOMES DANTAS GURGEL - IAM-FIOCRUZ/PE, MARIANA OLÍVIA SANTANA DO SANTOS - IAM-FIOCRUZ/PE, ALICE MARIA BARBOSA DA SILVA - IAM-FIOCRUZ/PE


Apresentação/Introdução
No Brasil, em 2021, foram consumidas 720,87 mil toneladas de agrotóxicos (IBAMA, 2021), colocando o país entre os maiores consumidores desses agentes no mundo. Entre os 440 ingredientes ativos (IAs) com uso autorizado no Brasil, 127 (28,86%) têm uso autorizado no cultivo da cana-de-açúca r(GURGEL et al., 2021) Boa parte desses agrotóxicos é proibida na União Europeia (UE), expressando uma conjuntura brasileira de desregulação ambiental e sanitária.
O país possui a maior produção mundial de cana-de-açúcar, sendo Pernambuco o segundo maior produtor das regiões Norte e Nordeste (CONAB, 2020).
Estudos recentes denunciam a penosidade do trabalho humano, sua exploração pelo setor sucroalcooleiro e a deterioração da saúde dos trabalhadores da cana, expostos às condições precárias e insalubres do processo produtivo.

Objetivos
Analisar o processo de exposição aos agrotóxicos e os danos à saúde dos trabalhadores das lavouras de cana-de-açúcar em Pernambuco.

Metodologia
Trata-se de pesquisa participante com análise exploratória e qualitativa, para compreensão dos significados, interações e comportamentos dos sujeitos em suas vivências e circunstâncias. Foi desenvolvido em cinco municípios de Pernambuco: Água Preta, Sirinhaém, Goiana, Itambé e Aliança.
Os dados primários foram coletados entre janeiro e agosto de 2022, por meio da realização de oficinas com comunidades expostas para a construção de um Diagnóstico Rural Participativo (DRP) sobre as vulnerabilizações socioambientais oriundas do processo produtivo sucroenergético.
Cada oficina teve duração de duas horas e média de 10 participantes, sendo selecionados maiores de 18 anos, moradores locais ou trabalhadores da cana-de-açúcar que residem no território. O produto final das oficinas foi a materialização do ‘fluxograma de trabalho’, construído e validado pelo coletivo participante.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Aggeu Magalhães, alinhado à Resolução do Conselho Nacional de Saúde/CNS nº 466/2012.

Resultados e discussão
A condensação de significados dos discursos das comunidades nas oficinas identificou os temas centrais e suas categorias. O primeiro tema central descreve o fluxograma de trabalho nas lavouras de cana-de-açúcar e as etapas de preparo do terreno, plantio, cultivo, corte, colheita e transporte das lavouras e o armazenamento e descarte das embalagens dos agrotóxicos utilizados.
O segundo tema central caracteriza as vias de exposição por inalação, ingestão e absorção dérmica dos agrotóxicos manipulados durante o trabalho nas lavouras e classifica os danos à saúde em intoxicações agudas, crônicas e desfechos fatais.
A observação do fluxograma de trabalho sugere que o uso de agrotóxicos opera como pilar de sustentação do processo produtivo canavieiro. Evidenciou os padrões permanentes de exposição aos agrotóxicos nas principais etapas de trabalho nas lavouras.
A exposição aos agrotóxicos por inalação foi relatada nos cinco territórios estudados e apontada em todas as etapas do fluxograma de trabalho, destacando as percepções sensoriais vinculadas ao forte odor emanado por alguns agrotóxicos nas atividades de manejo e mistura de venenos a ser aplicado na lavoura, e aos aerossóis dispersos na atmosfera na pulverização do solo.
A exposição por ingestão foi referida e relacionada às práticas insalubres do cotidiano de trabalho na agricultura e à ingestão crônica familiar de alimentos e águas contaminadas.
A exposição por absorção foi relatada e associada às atividades de manejo, mistura e aplicação dos venenos e ao contato direto da pele do trabalhador com as plantações contaminadas, sendo a via mais comum associada às intoxicações ocupacionais.
Os danos agudos à saúde foram relatados com sinais e sintomas imediatos como cefaleia, náusea, vômito, etc. e relacionados também a manifestações respiratórias. Já os crônicos, os relatos mostram manifestações tardias como doenças endócrinas, metabólicas, oncológicas. Os comunitários descrevem ainda casos fatais oriundos de acidentes de trabalho por intoxicações.

Conclusões/Considerações finais
O padrão e as características do trabalho na cana-de-açúcar apresentam elementos críticos do processo saúde-doença sob o domínio do agronegócio. Faz-se urgente e necessária a construção de políticas públicas e legislações socioambientais, a partir do envolvimento das populações expostas com avaliação periódica nos âmbitos da vigilância epidemiológica, sanitária, ambiental e do trabalhador.