47476 - CONFRARIA DA LUTA - GRUPO TERAPÊUTICO DE ACOLHIMENTO E FORMAÇÃO POLÍTICA DE MULHERES QUE ABORTARAM VOLUNTARIAMENTE MAYZA ALLANI DA SILVA TOLEDO - ESCOLA TERRITÓRIOS AFETIVOS, MARIANA GUEDES MACHADO - ESCOLA TERRITÓRIOS AFETIVOS, THAIANA CORRÊA CAVALCANTI - ESCOLA TERRITÓRIOS AFETIVOS, CAMILA MARTINS RIBEIRO - ESCOLA TERRITÓRIOS AFETIVOS
Contextualização Depois das mulheres vivenciam um aborto voluntário, elas ficam psicologicamente afetadas: desenvolvem ansiedade, quadros de tristeza profunda que chegam a depressão, perdem o emprego, se afastam do grupo de amigas, terminam os relacionamentos, se isolam da família. O crime de aborto coloca a experîencia de interromper a gestação por livre escolha num lugar de clandestinidade. Isso condiciona as mulheres que abortaram, ainda que de forma segura, a uma experiência de isolamento social. Não bastasse a dificuldade em conseguir informações seguras e os meios para interromper o desenvolvimento da gestação, as protagonistas do aborto voluntário precisam lidar com a falta de espaços sociais de elaboração das emoções e subjetividades que lhes atravessam desde o BetaHCG positivo até o alívio do aborto ter dado certo e ela “não ter morrido”. Sim, porque muitas acreditam que podem morrer durante o procedimento e os dados mostram que metade das mulheres que abortaram em 2015 precisaram de internação para encerrar o procedimento. Além disso, o perfil de mulheres com maior risco de morte são mulheres em situação de vulnerabilidade, pretas, pardas e indígenas, de baixa escolaridade, que vivem nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do país.
Descrição A Confraria da Luta constitui-se de reuniões presenciais que promoveram o encontro entre protagonistas de aborto voluntário, doulas radicais - mulheres que apoiam outras em suas decisões autônomas; terapeutas integrativas de constelação sistêmica e mulheres feministas pró-legalização do aborto, bem como rede de suporte às protagonistas. Os encontros iniciam com um jogo ou técnica de sensibilização, com base na temática escolhida para aquele encontro, como por exemplo: “útero” ou “transformação”. Pode ser a leitura de um texto ou observação de uma imagem. Em seguida, pede-se que as participantes tragam suas impressões, e sentimentos imediatos. Na sequência, dividimos o grande grupo em a) protagonistas e b) doulas/rede de suporte. O grupo A, mediado por uma mulher feminista, terapeuta de práticas integrativas, partilhou suas experiências particulares durante o aborto vivenciado. O grupo B, mediado por educadora popular e doula, partilhou experiências acerca de protocolos de cuidado, proteção e manutenção da vida das mulheres. Posteriormente, realizou-se uma constelação sistêmica com uma das protagonistas, culminando com uma partilha maior acerca das disputas patriarcais que atravessam a liberdade das mulheres.
Período de Realização Dez de 2020 a Fev de 2021.
Objetivos - Compreender o aborto enquanto um evento comum na vida reprodutiva das mulheres e sua criminalização enquanto um ato de perseguição patriarcal.
- Possibilitar que as mulheres tenham um espaço seguro para conversar sobre a experiência individual de abortar, trocar relatos e narrativas com outras protagonistas, a fim de se afastar da culpa ou do sentimento de inadequação social - característicos de quem cometeu um crime;
- Viabilizar que as protagonistas se reconheçam na narrativa da outra e sintam que não são as únicas a desejar outro destino de vida que não a maternidade, ao menos naquele momento e que a experiência de abortar seja sentida como uma experiência social;
- Acolher as narrativas individuais e subjetivas, a fim de que tenham um lugar legítimo e livre de julgamentos, tanto na perspectiva da moral cristã - que culpabiliza, condena e persegue; como na perspectiva feminista contemporânea, onde a máxima do “meu corpo minhas regras” não dá conta de acolher os afetos, as transformações sociopolíticas que sucedem
Resultados Construção de uma rede de financiamento e suporte a protagonistas, 22 doulagem de urgência, Criação do grupo de estudo virtual Confessionário, Criação do grupo em aplicativo específico para trocas seguras.
Aprendizados Ao juntar protagonistas do aborto voluntário, ganhamos força na luta pela legalização;
O acesso à informação e à rede de apoio é o maior desafio das mulheres que precisam interromper a gestação;
Os parceiros costumam abandonar as mulheres durante ou após a interrupção.
É importante difundir e lutar pela presença de uma doula também no aborto voluntário
Análise Crítica Quando se fica grávida, uma série de transformações bioquímicas invadem a existência da mulher. Ela precisa atravessar essa mudança biológica sem entender muito bem o que está sentindo e tendo que dar conta das tarefas que o capitalismo lhe incube. Ao abortar, essa alteração corporal é interrompida bruscamente - já que aqui no Brasil, não se pode usar mifepristona, somente misoprostol. A interrupção da gestação traz uma mudança no funcionamento hormonal da mulher que está grávida. Ou seja, ela precisa de um resguardo após o aborto e, se tratando de um crime, não há espaço social para esta necessidade de repouso. Não tem CID que dê conta do repouso de uma semana que é o mínimo para que o sangramento menstrual cesse e o estrógeno comece a subir novamente, bem como que ela restabeleça a ferritina que perdeu durante o abortamento.
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