Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC33.3 - Política de ST / VISAT e Precarização do Trabalho III

47581 - TRABALHADORES (IN)VISIBILIZADOS: UM RELATO DE PESQUISA NO CONTEXTO DE TRABALHO DE EQUIPES DA ATENÇÃO BÁSICA
ANDRÉA GARBOGGINI MELO ANDRADE - SESAB/SUVISA/DIVAST/CESAT, MÔNICA ANGELIM GOMES DE LIMA - PPGSAT/UFBA, PAULO EDUARDO XAVIER DE MENDONÇA - IESC/UFRJ


Apresentação/Introdução
“E da nossa saúde quem vai cuidar?” Essa pergunta soou como um “grito” por ajuda que denunciava a ausência de cuidado para com trabalhadores de uma unidade de saúde da família (USF), na cidade de Salvador-BA. “A gente tem que brigar internamente para que reconheçam o nosso adoecimento. Me sinto só, só tenho obrigações.”. Essas e muitas outras falas registradas em diário de campo logo após a apresentação da pesquisa de mestrado que seria iniciada naquela unidade, em 2017. Emudecida, segui ouvindo desabafos e reivindicações que passaram a ecoar na minha cabeça, visibilizando “marcas” de um trabalho desgastante inscritos nas falas, expressões do corpo, nos silêncios, na camisa surrada, no suor escorrendo pelo rosto, nas queixas de dor e sinais de sofrimento mental. Imergi na USF, acompanhando a rotina de atividades, atendimentos e reuniões de cinco equipes de atenção básica e uma equipe de Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB).

Objetivos
Discutir a implementação de ações de saúde do trabalhador no SUS a partir do reconhecimento de demandas de saúde de usuários relacionadas ao trabalho pela equipe da USF.

Metodologia
As questões disparadoras inicialmente elaboradas foram: as demandas de saúde relacionadas ao trabalho de usuários são reconhecidas? Como e por que essas demandas (não)são reconhecidas? O que decorre (atos seguintes) desse reconhecimento? As afetações causadas desde o primeiro contato com as equipes contribuíram de forma rizomática, ampliando as perspectivas. Guiada pelo referencial da pesquisa etnográfica, impregnada pela experiência profissional em um Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador e com todos os sentidos aguçados, enxerguei o que não estava necessariamente explícito aos demais olhares nas “cenas observadas”.

Resultados e discussão
Compreendi o “peso” de ser profissional-trabalhador de saúde numa USF sentido e expressado no corpo e na voz dos profissionais que tive a oportunidade de interagir. A vocação e o desejo de cuidar do outro manifestaram-se impactados pelos desafios de ter que carregar nas costas um sistema de saúde com toda a sua complexidade e contradições. Dei-me conta de que, para discutir como demandas de saúde relacionadas ao trabalho emergiam da interação entre os profissionais da USF e usuários adultos atendidos, seria necessário compreender o processo de trabalho daquele coletivo de trabalhadores. Dentre os resultados apresentados na dissertação de mestrado, defendida em maio de 2019, descrevi aspectos compreendidos enquanto barreiras dispostas em diferentes dimensões (“camadas”), sobrepostas, que atuavam de forma dinâmica e até mesmo sinérgica, comprometendo o reconhecimento do usuário-trabalhador em diferentes gradientes: ofuscando a visão do profissional de saúde; retardando o desenvolvimento de ação (na perspectiva da saúde do trabalhador); ou interditavam a comunicação entre os profissionais nas redes de atenção à saúde. O (não)reconhecimento de usuário-trabalhador no contexto da interação com os profissionais de saúde foi descrito enquanto resultado de interrelações percebidas entre aspectos das decisões políticas e administrativas no contexto nacional, municipal e da gestão da USF (dimensão política); das características sociais e demográficas do território (dimensão territorial); das condições do ambiente e processo de trabalho dos profissionais de saúde (dimensão do trabalho real); das expectativas dos usuários e das competências dos profissionais de saúde (dimensão individual). Por trás da dita INvisibilidade de usuários-trabalhadores no contexto da atenção básica essa pesquisa apontou para a necessidade de melhor abordarmos a INvisibilidade de profissionais-trabalhadores da atenção básica, como condição para avançarmos no desenvolvimento de estratégias que viabilizem a implementação do cuidado integral no SUS, conforme previsto nos textos das políticas nacionais da atenção básica e da saúde do trabalhador e da trabalhadora. Por trás da abordagem queixa-conduta dos profissionais, constatei uma diversidade de aspectos que ofuscam ainda mais a sua visão, retardando ou interditando a sua ação de visibilizar o usuário-trabalhador e suas demandas de saúde.

Conclusões/Considerações finais
Os resultados apresentados na dissertação constituíram-se como ponto de chegada para impulsionar uma nova partida, a pesquisa de doutoramento iniciada em 2022, que propõe um novo giro analítico sobre INvisibilidades e apagamentos da saúde de trabalhadores e suas implicações para a “gestão-cuidado” em Saúde do Trabalhador no SUS.