47930 - (RE)ESTRUTURAÇÃO DE UM SERVIÇO VOLTADO AO CUIDADO A PESSOAS COM TRANSTORNOS ALIMENTARES A PARTIR DO REFERENCIAL PSICANALÍTICO: RELATO DE EXPERIÊNCIA THAMIRES MONTEIRO LARANJEIRA MOTA - UERJ, CAROLINA DE OLIVEIRA COUTINHO - UERJ, ARUANNA CAJATY SOARES - UERJ, LIVIA BARBOSA CORRÊA - UERJ, MAYARA CRISTHINNE CEZARIO PORPHIRIO - UERJ, JULIANA HONORATO RODRIGUES - UERJ, ALESSANDRA DA ROCHA PINHEIRO MULDER - UERJ, CRISTIANE MARQUES SEIXAS - UERJ
Contextualização O manejo dos transtornos alimentares (TA) tem se apresentado como um grande desafio. A redução desses quadros aos fenômenos destacados pelos manuais psiquiátricos atuais mantém as manifestações restritas ao discurso biomédico, deixando outras teorias na periferia, evitando-se discussões que poderiam contribuir para a abordagem dos sujeitos. Nesse contexto, as diretrizes médicas apontam as terapias comportamentais como melhor alternativa para abordagem dos quadros de TA, recusando-se a perspectiva psicanalítica. Entretanto, frequentemente a clínica dos TA aponta para o fracasso de uma proposta médica terapêutica normativa, que tem como base a universalização do fenômeno. Nesse contexto, o discurso psicanalítico acrescenta uma compreensão dos sintomas além do universal, do anônimo e classificatório das categorias, levando em conta o particular do sujeito.
Descrição Assim, este relato apresenta o percurso que vem sendo desenvolvido no contexto do Núcleo de Assistência e Pesquisa em Transtornos Alimentares da UERJ, o NAPTA, criado em 2011 de modo integrado às atividades do Departamento de Nutrição da Policlínica Piquet Carneiro, compondo a rede pública de saúde do município do Rio de Janeiro no nível da atenção secundária. Ao longo dos anos, ocorreram algumas tentativas de reestruturar e manter o funcionamento do serviço. Porém, com o advento da pandemia de COVID-19 a equipe passou a ser composta somente por uma nutricionista, o que implicou na suspensão do acolhimento de novos pacientes e impôs a urgência de construir uma proposta de reestruturação que atendesse tanto à necessidade de sustentar o oferecimento de tratamento interdisciplinar às pessoas com TA, quanto de retomar e consolidar a proposta de ser um espaço de pesquisa e formação.
Período de Realização A experiência relatada se iniciou em janeiro de 2021 e segue em curso.
Objetivos O objetivo principal foi repensar as atividades assistenciais e de formação profissional do NAPTA, dando início a um novo projeto que se sustenta na construção de uma equipe interdisciplinar a partir do referencial psicanalítico.
Resultados Dadas as dificuldades estruturais da universidade que se refletem na ausência de profissionais da psicologia e da psiquiatria vinculados à equipe, o primeiro desafio que se colocou foi associar voluntários, captar bolsas de extensão, capacitação técnica e pesquisa, além de afinar parcerias institucionais. Nessa direção, estabeleceu-se a parceria de trabalho com o Programa de Pós-graduação em Psicanálise da UERJ. Hoje o NAPTA conta com a participação de 14 voluntários, entre psicólogos de orientação psicanalítica, nutricionistas, médica e graduandos. Ainda, foram captadas 1 bolsa de extensão, 2 bolsas de técnico de nível superior e 1 bolsa de iniciação científica. De tal modo, foi possível oferecer o acolhimento no modelo interdisciplinar, necessário para manejo dos TA e proposto como política do serviço. Ademais, investiu-se na realização de oficinas para construção dos fluxos de acesso ao serviço e de atendimento pela equipe e passou-se a realizar reuniões quinzenais para construção dos casos clínicos. Tal construção se dá ao longo do tempo a partir do paciente, de acordo com a escuta, o manejo da transferência e a relação singular do sujeito com o seu sintoma, com os profissionais e com o NAPTA.
Aprendizados A proposta de pensar o tratamento dos TA a partir de uma leitura psicanalítica nos permite considerar a complexidade e a diversidade dos casos, demandando criatividade para (re)construir os caminhos percorridos pelo sujeito, nos quais se articulam o sofrimento e os sentidos próprios para o que foi vivenciado. Assim, reafirma-se o equívoco em abordar os casos de TA centrada em um ideal de saúde e visando somente à “normalização” do peso e à superação dos sintomas descritos nos critérios diagnósticos.
Análise Crítica Observamos que os limites a serem estabelecidos entre as intervenções de profissionais das diferentes categorias que compõem a equipe interdisciplinar causa inúmeras dúvidas e desconfortos, por não se saber onde termina o papel de cada uma delas. No entanto, a subjetividade é algo que perpassa a abordagem de todos, não admitindo, portanto, nenhuma fronteira rígida. Logo, o contexto exige pensar em novas formas de interação entre os saberes e entre os profissionais, possíveis de promover a aproximação com a complexidade da realidade. Outrossim, salienta-se o papel da equipe como uma rede de suporte para a angústia que, inevitavelmente, acomete também seus profissionais. Todavia, a interdisciplinaridade ainda constitui um desafio na implementação dos princípios do Sistema Único de Saúde. Conforme o serviço toma forma, outros desafios e impasses se apresentam. Formar redes e sustentar o desejo de criar é o que nos faz caminhar na direção de um serviço que encontre um horizonte mais acolhedor para uma prática que exige dos profissionais, muitas vezes, o enfrentamento não só das questões estruturais, mas das subjetivas que nos acompanham a cada novo caso.
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