02/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC24.1 - Nada sobre mim, sem mim: História, saúde e resistência |
46726 - "DIÁRIO DE UMA FAVELADA": OS ESCRITOS DE CAROLINA MARIA DE JESUS PARA UMA ANÁLISE DE CONJUNTURA EM SAÚDE NO BRASIL. MILENA DA SILVA MEDEIROS - UFAL, ANA CLARA DE ALMEIDA ROCHA - UFAL, SANDY HELLEN DE LIMA CAVALCANTE SANTOS - UFAL
Contextualização O Código de Ética Profissional do Psicólogo tem como um de seus princípios fundamentais uma atuação pautada em uma análise crítica e histórica da realidade política, econômica, social e cultura, bem como a promoção de saúde e qualidade de vida que busque eliminar quaisquer formas de negligência, violência, crueldade e opressão. Para isso, uma formação que ofereça referenciais que fomentem uma visão crítica da realidade em que o/a profissional será inserido se torna fundamental. Considerando tal ponto, a leitura de autores e autoras como Carolina Maria de Jesus, que vivenciam a crua realidade brasileira, a partir de diferentes marcadores de classe, raça, gênero e sexualidade permite ter uma visão mais ampla, pois volta as atenções a vozes nem sempre contemplada pelas bibliografias brancas e cismasculinas comuns nos currículos universitários.
Descrição Nos caminhos para construir uma formação aproximada dos princípios de atuação do/a psicólogo/a, a disciplina Psicologia e Sociedade incentivou a leitura de Carolina Maria de Jesus se apresenta como mecanismo para conhecer a vida de uma mulher negra, favelada e que vivencia uma maternidade solo de três crianças. Com pouca educação formal e muita sabedoria de vida, a autora supracitada tem como obra de maior destaque o seu primeiro livro: Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada, que foi publicado em 1960. Nesse diário, Carolina fala sobre seu cotidiano como catadora, a conjuntura política de sua época, histórias dos/as moradores da favela, e também sobre a fome e miséria que pouco se diferenciam dos retratos dos últimos tempos. Ao narrar sua história, Carolina também nos apresenta a sua vivência de negação de direitos e das faltas de acesso que lhe impedem de experimentar o bem viver e afetam a sua saúde.
Período de Realização Esse relato de experiência se debruça sobre a disciplina Psicologia e Sociedade, cursada durante o período de outubro a Dezembro de 2021.
Objetivos Buscou-se por meio da análise do livro Quarto de Despejo: Diário de uma favelada, escrito por Carolina Maria de Jesus, compreender como as noções sobre saúde são vivenciadas pela autora, bem como ampliar a perspectiva sobre aspectos que envolvem a promoção ou não de saúde mental, em realidades brasileiras negras periféricas, a partir do contexto histórico apresentado no livro, para que através disso ocorra a promoção de uma formação acadêmica que incentive a análise crítica da realidade presente e do contexto histórico em que se fundam as opressões e violências que precisam ser combatidas no tempo atual.
Resultados Nos seus escritos, Carolina relata constantemente um cansaço presente no seu dia, devido a grande carga de trabalho, que por vezes não oferecia nem condições mínimas para a sobrevivência dela e dos filhos, pois em suas palavras, mesmo assim ela vivia "em falta". O nervosismo também é outra presença permanente em seu cotidiano, pela falta do que comer e insegurança com o bem estar dos seus próprios filhos enquanto permaneciam na favela durante sua jornada de trabalho. Ao pontuar sobre iniciativas dos órgãos de saúde, Carolina apenas cita sobre as campanhas que exponham conhecimentos e recomendam ações difíceis de serem alcançadas pelos/as moradores/as da favela. Quanto a saúde mental, Carolina destaca como as faltas de recursos e fome são pontos centrais, pois ela chega a narrar sobre um caso de suicídio de uma senhora que passava fome junto aos filhos e que ao adoecer também "andava até querendo suicidar por faltar de recursos", inclusive quando seus filhos adoecem, isso a deixa ainda mais nervosa já que ela precisa recorrer a alternativas naturais, pois não tinha dinheiro para recorrer a medicamentos, e a possibilidade de recorrer a atendimento médico era ainda mais assustadora, tendo em vista os custos para um atendimento em um Brasil que ainda não conhecia um sistema de saúde público.
Aprendizados A leitura de Carolina nos marca profundamente, por denunciar uma realidade de fome, insegurança alimentar e abandono da população moradora de favela pelos aparelhos do Estado. Através dessa escrita-denúncia, se faz necessário estar atento/a para as reverberações desse processo histórico na conjuntura atual e das suas implicações para pensar a promoção de saúde.
Análise Crítica Carolina pontuou que a escravatura de sua época era a fome, e em 2022, 33,1 milhões de pessoas ainda estavam sob o peso dessa escravatura. A análise do livro é necessária para uma formação que incentive uma postura profissional crítica da realidade atual e histórica, bem como atenta a uma promoção de saúde, destacando a saúde mental, que busque compreender as realidades atravessadas pela fome, racismo, violência, sexismo e pobreza. Sobretudo, a análise nos faz compreender como a luta pelo fim das violências e opressões que se encaixam nos fundamentos de atuação são também uma luta pela construção de uma saúde que se propõe a equidade e universalização.
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