Comunicação Oral

01/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO20.1 - Direitos reprodutivos: aborto e contracepção

45997 - A PERCEPÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE SOBRE O USO DE CONTRACEPTIVOS EM MULHERES USUÁRIAS DE SUBSTÂNCIA
YÁRITA CRYS ALEXANDRE HISSA MEDEIROS - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA, ELISABETH MELONI VIEIRA - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA


Apresentação/Introdução
Este resumo apresenta uma análise parcial dos dados coletados em uma pesquisa que investiga as relações entre Saúde Sexual e Reprodutiva, uso de substâncias e as práticas de Redução de Danos nas vivências de mulheres usuárias de drogas. O estudo desenvolve-se a junto ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da Universidade de São Paulo e conta com a colaboração da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo. Este trabalho também foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.


Objetivos
Este trabalho objetiva analisar as práticas contraceptivas de usuárias dos CAPS ADs (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas) de São Paulo, a partir da perspectiva de profissionais que atuam nestes equipamentos.

Metodologia
O enfoque da pesquisa volta-se para as práticas em saúde e políticas públicas destinadas ao cuidado de mulheres em uso abusivo de substâncias. Por isso, entrevistamos 13 profissionais que trabalham em CAPS ADs das regiões Centro, Sudeste e Oeste de São Paulo, capital.
Como método utilizamos a Entrevista em Profundidade a partir da elaboração de um roteiro prévio de perguntas abertas. Foram feitas em média duas entrevistas por profissional, por meio de plataformas virtuais. Após a transcrição dos áudios, foi realizada a análise sob uma perspectiva hermenêutica usando como referencial as teorias sobre as Normas e Sistemas de Gênero, trazendo a lente das desigualdades de gênero para a leitura sobre os processos de saúde e adoecimento.
Dentre as categorias formuladas durante a análise, debateremos neste trabalho, a partir da perspectiva das profissionais entrevistadas, o acesso e uso de métodos contraceptivos por mulheres usuárias de drogas, assim como sua adequação ao modo de vida dessas mulheres.
O estudo também foi aprovado pelos Comitês de Ética da Faculdade de Saúde Pública (USP) e Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo.


Resultados e discussão
A adoção de métodos contraceptivos não depende apenas do desejo da mulher, mas é atravessada por diversos fatores, como: o seu contexto de vida, a percepção dos profissionais quanto a adequação dos métodos anticoncepcionais (MACs), assim como sua oferta no sistema de saúde.
À respeito da disponibilidade de insumos, as entrevistadas afirmam que os métodos mais ofertados pelos equipamentos de saúde às mulheres usuárias de substâncias são os métodos de longa duração (LARCS) ou a Laqueadura, pois os profissionais já têm como princípio que as mulheres usuárias de drogas são incapazes ou têm muita dificuldade de usar corretamente métodos que demandem manutenção de rotina. A injeção trimestral, por exemplo, é usualmente indicada para essas mulheres, em detrimento de outros, o que expressa uma restrição de acesso a outros MACs.
A limitação de acesso também ocorre através da orientação oferecida pelos profissionais de saúde, pois muitas vezes esta orientação limita-se a contraceptivos específicos ou ocorre de forma impositiva na indicação de determinado MAC. Este contexto reforça a desinformação das mulheres em relação à contracepção e desconsidera o direito da mulher de decidir sobre seu corpo.
A disponibilidade restrita de alguns métodos contraceptivos, associada à uma orientação enviesada, expressam, portanto, um cerceamento da autonomia da mulher quanto a sua trajetória reprodutiva, podendo ser compreendida como uma coerção contraceptiva.
Quanto ao contexto de vida, além da limitação em usar métodos contraceptivos que demandem rotina, foram relatadas várias dificuldades no uso de preservativo durante o ato sexual devido ao estado alterado de consciência das mulheres ao usarem drogas e a imposição dos parceiros no sexo desprotegido no contexto de prostituição, seja como profissão ou como meio de adquirir a substância, o que as torna vulneráveis às ISTs e à gravidez. Essas práticas, além de impedir o uso da contracepção, configuram-se como violência e devem ser abordadas como tal nos equipamentos de saúde
As normas de gênero também afetam a adesão das mulheres usuárias de substâncias às MACs através da forma como elas relacionam-se com seus parceiros. Elas, ao possuírem apenas um companheiro, sentem-se protegidas de ISTs e, consequentemente, não realizam cuidados quanto à saúde sexual e reprodutiva. Esta resistência parte da ideia de que o uso de contracepção indica traição o que, considerando as normas de gênero, impacta significativamente nas práticas em saúde dessas mulheres.


Conclusões/Considerações finais
Estes relatos explicitam como o sistema de gênero produz adoecimentos e atravessa as práticas em saúde, especialmente ao cercear a autonomia sexual e reprodutiva de mulheres, sendo esses adoecimentos agravados no contexto de uso de substâncias. Necessita-se, em vista disso, repensarmos as práticas em saúde voltadas, em especial às usuárias de substâncias, considerando os efeitos das normas de gênero, a fim de efetivar os princípios de equidade, universalidade e integralidade em saúde.