Comunicação Oral

01/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO11.1 - Envelhecimento, pandemia de Covid-19 e interseccionalidades

45964 - A REDE DE SUPORTE SOCIAL DE IDOSOS GAYS DURANTE A PANDEMIA COVID-19: UMA ANÁLISE QUALITATIVA
THAÍSSA ARAUJO DE BESSA - USP, HELENA AKEMI WADA WATANABE - USP, RODRIGO OTÁVIO MORETTI PIRES - USFC


Apresentação/Introdução
A Organização Mundial de Saúde, em março de 2020, declarou a vigência da pandemia da covid-19. Muitos países adotaram políticas de distanciamento social, visando diminuir o número de vítimas e evitar o colapso dos sistemas de saúde. Embora toda a população mundial seja suscetível à doença, os impactos sobre a população mais velha têm sido maiores. Esses impactos puderam ser sentidos com maior intensidade em comunidades duplamente invisibilizadas e marginalizadas como as pessoas idosas LGBTQIA+. Assim, entendermos como se deu o suporte social dessa população neste período de isolamento tornou-se crucial.Devido a dificuldade de acessar os interlocutores de forma on-line optamos por incluir neste estudo apenas idosos homossexuais masculinos (gays).


Objetivos
Compreender como idosos gays brasileiros vivenciaram o período de isolamento e distanciamento social na pandemia, para entender o momento vivenciado e seu impacto nas relações sociais em suas redes de suporte social.


Metodologia
Este é um estudo qualitativo, realizado com 15 homens gays brasileiros com 60 anos ou mais. A partir de um roteiro semi-estruturado, as entrevistas foram realizadas entre junho de 2020 e novembro de 2021, on-line e individualmente, com amostragem do tipo “bola de neve”.Traçou-se o perfil dos entrevistados e os discursos foram analisados através das técnicas de análise categorial de Laurence Bardin.


Resultados e discussão
O perfil de participantes se assemelha a outras pesquisas realizadas mundialmente em que temos uma maioria de participação de idosos mais jovens(60 e 69 anos), brancos(13), residentes de capitais(10), com alta escolaridade e de classe média/alta. A maioria residia sozinho e estava solteiro. Em relação ao cenário de pandemia de COVID-19, a maioria revelou ter enfrentado algum impacto na saúde mental. A solidão, falta de empatia, a dependência momentânea e a adaptação à nova realidade de afastamento do trabalho e das atividades corriqueiras apareceu em quase todas as entrevistas. A dificuldade na compra de alimentos via delivery ou aplicativos e o pagamento de boletos de forma virtual, além do excesso no consumo de bebidas alcoólicas apareceram enquanto dificuldades vivenciadas nesse período. Os participantes afirmaram ter deixado de frequentar locais de socialização gay neste período e utilizaram aplicativos e redes sociais para se conectar a amigos, familiares, parceiros e para participar de grupos. A utilização de aplicativos de streaming apareceu como um suporte na ocupação dos dias de isolamento. Quando perguntados se o fato de ser LGBT ajudou ou tornou mais difícil enfrentar o momento de isolamento social, alguns pontuaram terem criado ao longo dos anos laços sociais suficientemente fortalecidos pelo fato de serem gays, outros pontuaram que ser gay e estar sem parceiro neste momento de isolamento foi um dificultador. Quanto a análise categorial, analisou-se os discursos em três categorias: rede de suporte social formal, rede de suporte social informal, e um terceiro componente transversal, a idade. Quando ao suporte social formal, os relatos relacionados à família de origem apareceram em uma frequência menor em comparação às redes de amizade, reforçando a importância de se diferenciar as redes devido aos efeitos diferentes produzidos uma vez que a rede familiar é “involuntária” e a rede de amigos e vizinhos é uma escolha voluntária, sendo potencialmente mais positiva. Ainda, temos presente o papel das relações afetivas amorosas.Os participantes solteiros apontaram para um desarranjo da vida sexual e amorosa devido a impossibilidade de contato pessoal e físico, enquanto os que têm parceiros trouxeram relatos do cuidado desempenhado por seus companheiros. Quanto à rede de suporte social formal, houve procura por grupos de apoio, grupos de estudos e terapia em especial devido às incertezas em relação à doença, imprevisibilidade sobre o futuro e o isolamento social. Já o recorte etário influenciou na percepção do suporte recebido, primeiro devido à diminuição dos contatos próximos com o passar dos anos, ao medo da solidão presente na velhice LGBT+ e por último devido a homonormatividade, ou seja, o padrão socialmente aceito pelo grupo LGBT, associado à jovialidade e à exaltação de um corpo belo. Essa interseccionalidade aparece de maneira velada na fala de um dos entrevistados.


Conclusões/Considerações finais
Observou-se que a rede de suporte social informal composta principalmente por amigos e parceiros – a família de escolha – foi mais relevante e potencialmente mais segura durante o período de isolamento social. Já a rede de suporte formal teve papel importante no suporte a questões emocionais e mentais neste período. O recorte socioeconômico da amostra pode ter garantido facilidades no acesso a serviços de saúde, inclusive de saúde mental, diminuindo os impactos negativos relacionados ao período pandêmico. Aponta-se a escassez de estudos realizados no país a respeito da temática, o que evidencia a necessidade de ampliação da compreensão em contextos fora do eixo europeu e norte americano.