01/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO5.1 - Gênero, sexualidades, identidades e o cuidado em saúde |
47266 - MASCULINIDADES TRANSTORNADAS: UM ESTUDO SOBRE OS DESAFIOS DO CUIDADO A HOMENS COM TRANSTORNOS ALIMENTARES CAROLINA DE OLIVEIRA COUTINHO - UERJ, CRISTIANE MARQUES SEIXAS - UERJ
Apresentação/Introdução Os transtornos alimentares (TA), quadros que possuem relevância não somente no plano clínico-individual, mas também como questão de Saúde Coletiva, podem ser definidos como quadros clínicos caracterizados por graves alterações do comportamento alimentar, sofrimento e/ou preocupação excessiva com a forma ou o peso corporal. Embora se afirme o caráter biopsicossocial dos TA, o enfoque das pesquisas tende a se dirigir aos aspectos biológicos, sendo o papel dos fatores socioculturais na gênese e definição do diagnóstico dos quadros abordado de maneira superficial e simplificada. Apesar de as primeiras referências históricas aos quadros de TA já incluírem o relato de meninos com sintomas clássicos, a ocorrência de tais quadros na população masculina permaneceu marginalizada na medicina, havendo enorme escassez de estudos sobre a temática. Entre as justificativas fornecidas para tal constatação, estão o número reduzido de casos identificados e a baixa procura dos homens por tratamento médico. Entretanto, tais justificativas não levam em consideração o modo como os estereótipos acerca do masculino/feminino são formulados e reproduzidos culturalmente e o papel da biomedicina na produção de saberes e na reprodução de valores característicos de um contexto cultural. Segundo estudos populacionais recentes, os TA são claramente mais prevalentes entre homens do que se imaginava, podendo chegar a um terço dos casos. Outrossim, argumenta-se que a assimetria no número de casos pode ser reflexo de um viés de gênero presente nas atuais conceituações e critérios diagnósticos por criarem uma distinção nosológica que pode, por si mesma, ser tendenciosa na identificação dos casos em mulheres, desencorajando o exame da sua expressão em homens. Neste contexto, o pressuposto de gênero acerca das masculinidades afirma a necessidade de se ampliar a compreensão dos homens como sujeitos particulares e plurais em exercício de masculinidades distintas e que possuem assim, demandas de saúde diferenciadas, tendo o potencial de promover avanços acerca da complexidade dos quadros de TA em homens e de seu cuidado.
Objetivos Assim, esta pesquisa buscou analisar como as concepções de gênero e masculinidades impactam no cuidado à saúde de homens e meninos, especialmente no que tange à identificação, interpretação e no encaminhamento da terapêutica dos TA, a partir da narrativa de profissionais da atenção primária e atenção secundária à saúde do município do Rio de Janeiro.
Metodologia Foi empreendida pesquisa qualitativa, com realização de 17 entrevistas semiestruturadas individuais com profissionais de saúde de diferentes categorias profissionais atuantes na atenção primária e atenção secundária, neste último caso, em serviços que acolhem casos de TA. A análise do material empírico seguiu os princípios do Método de Interpretação de Sentidos. O olhar para as masculinidades se deu a partir do enfoque de gênero, orientado por uma perspectiva feminista.
Resultados e discussão Os resultados são apresentados em três categorias que contemplam conteúdos que se agruparam a partir da análise dos dados coletados: 1) produção de sentidos sobre as necessidades de saúde dos homens; 2) concepções de gênero e masculinidade(s) e suas relações com o cuidado em saúde; 3) gênero, masculinidades e produção de sentidos sobre os transtornos alimentares. As narrativas revelaram concepções essencialistas e binárias expressas em termos de estereótipos, o que dificulta a percepção das complexidades únicas das apresentações masculinas de TA. A centralidade feminina da estrutura diagnóstica dos TA, contribui com a reificação de padrões e iniquidades de gênero. Ademais, a estigmatização parece ser uma barreira particularmente problemática a ser enfrentada por homens com TA, dada a compreensão dos quadros enquanto um problema feminino e consequente associação à uma masculinidade “comprometida”. Ainda, evidenciou-se um discurso científico que, sob a lógica classificatória binária, reforça as construções sociais a respeito da masculinidade hegemônica e impossibilita que homens e mulheres – ou masculinidades e feminilidades – sejam vistos a partir do lugar da multiplicidade.
Conclusões/Considerações finais Logo, foi possível verificar que as práticas de cuidado em saúde tendem a reiterar desigualdades, desde a forma com que são tomadas as necessidades de saúde de homens e meninos; e mulheres e meninas na assistência cotidiana, até como são elaboradas suas propostas terapêuticas. Na medida em que o imaginário social de gênero oculta a emergência de necessidades e demandas masculinas quando estas vão de encontro aos padrões de masculinidades tidos como hegemônicos – que envolvem um modelo de corpo ideal e uma forma específica de se comportar e, porque não, de se alimentar -, como ocorre nos TA, produz-se um discurso simplista e superficial que nos afasta da possibilidade de refletir, com a complexidade exigida, sobre a relação dos homens com seus corpos, alimentação e cuidados com a saúde, dificultando a adoção de uma abordagem integral em saúde.
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