01/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO33.1 - APS_ESF_ACS |
46344 - CONJUNTURAS DE CRISE E TRABALHO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA: O PROCESSO DE TRABALHO DE ENFERMEIROS DO BRASIL E ESPANHA HELENA MARIA SCHERLOWSKI LEAL DAVID - UERJ, AMANDA DE LUCAS XAVIER - UERJ
Apresentação/Introdução A enfermagem vem integrando os sistemas de saúde e a Atenção Primária de Saúde (APS) na imensa maioria dos países. Na Espanha, a APS é a porta preferencial de entrada. Esse processo sofreu um profundo baque a partir do ano de 2008, quando a crise dos mercados econômicos atingiu a Europa. Na correlação de forças entre a classe trabalhadora e o capital, a Espanha capitulou ante as exigências da troika, com cortes de recursos públicos de saúde. O Brasil sofreu os efeitos tardios da crise, aliados a grave crise político-institucional , com medidas reformistas que tiveram impacto negativo na política de saúde. Mencione-se, ainda, todo o caos sanitário após a subida ao poder do governo Bolsonaro, agravado pela crise sanitária pela pandemia por Covid-19, o que só veio tornar mais visível o desinvestimento e o descaso com o Sistema Único de Saúde. Conhecer como as enfermeiras espanholas e brasileiras percebem as conjunturas de crise e suas contribui para tornar visível os seus efeitos no cotidiano de trabalho da APS e sobre a dinâmica da força de trabalho.
Objetivos Desenvolver um estudo em perspectiva comparada do processo de trabalho no trabalho de enfermagem na APS no Brasil outros países, considerando as conjunturas de crise
Metodologia A pesquisa se desenvolveu com base em três procedimentos metodológicos: i) levantamento documental sobre o processo de trabalho da enfermagem na Atenção Primária; ii) aplicação de um questionário sociodemográfico e com algumas perguntas abertase iii) entrevistas face a face, em profundidade. Responderam ao questionário um total de 63 profissionais de enfermagem: 31 enfermeiras (17 no Brasil e 14 na Espanha) e 32 técnicas/auxiliares de enfermagem (31 no Brasil e 1 na Espanha). Participaram das entrevistas, ao todo, 51 profissionais de enfermagem: 29 enfermeiras (16 no Brasil e 13 na Espanha), da gestão, administração municipal e assistência. O estudo, que deu origem a uma tese de doutorado, foi iniciado 2020 na Espanha, seguiu em 2020 no Brasil, e retomado na Espanha em 2021.
Resultados e discussão No cenário de aprofundamento da crise estrutural do capital, a demanda por maior contingente de profissionais de saúde é unânime. A Espanha, apesar dos ataques à APS, foi capaz de enfrentá-los e reestabelecer parcialmente direitos retirados em 2012. mostrando capacidade de lutas de seus profissionais e de mobilização da população. O processo de precarização do trabalho avança na Espanha à medida que vai sendo reduzida a força de trabalho estatutária, por aposentadoria, e a contratação flexível vai sendo implementada. No Brasil, as dificuldades do subfinanciamento crônico do SUS foram elevadas a um patamar mais grave, com “desfinanciamento” das políticas de educação e saúde. No cenário brasileiro a deterioração das condições de vida e saúde da população se dá em níveis maiores, com maior a carga de trabalho dos profissionais de saúde. O traço comum dos processos de “modernização” do aparelho do Estado são as reformas administrativas, evidenciando o caráter de classe dos Estados. A jornada de trabalho das enfermeiras e técnicas/auxiliares de enfermagem é cerca de 14% maior no Brasil. Na Espanha, ainda que haja “ampliação do acesso” a partir de horário estendido nas unidades de saúde (15h às 21h), a jornada de trabalho diária dos seus profissionais é de turno diário de 7h, enquanto no Brasil são de dois turnos de 4h. Agrega-se a essa jornada a intensificação do trabalho da enfermeira brasileira. O perfil demográfico da enfermagem mostra, no Brasil, uma maioria de jovens, com poucos anos de formação, e na Espanha, enfermeiras com vários anos de trajetória profissional. As brasileiras mostraram-se mais satisfeitas. Sobre o processo de trabalho, a maior parte das entrevistadas no Brasil e na Espanha entende a categoria necessidades de saúde como problemas de saúde e clínicos, pautados, sobretudo no paradigma biomédico, mencionando os temas: carência de acesso a recursos básicos para a reprodução cotidiana dos usuários; falta de informações e conhecimentos em saúde, déficit de autocuidado; e condições clínicas e principais doenças que aparecem no cotidiano dos serviços. Como categorias de instrumentos comuns de trabalho tem-se: escuta ativa, vínculo e acolhimento na relação intersubjetiva; conhecimento técnico sobre os fluxos, contextos e ação no território; conhecimento técnico relacionado às condições clínicas, sociais e culturais; gestão do cuidado; atribuições pré-determinadas pelas políticas de saúde como instrumento e finalidade em si do processo de trabalho em saúde.
Conclusões/Considerações finais Além das consequências sobre a saúde e perda de qualidade de vida da população, os impactos da crise econômica afetam os modelos de atenção à saúde e a autonomia profissional quanto determinam mudanças e pressões sobre os processos de trabalho a partir de interesses diversos. Persiste o desafio teórico-conceitual para estabelecer parâmetros comparativos entre países que atendam às categorias analíticas sobre o processo de trabalho da enfermagem.
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